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Atualizado: 28 de jun. de 2021








Tenho aparelhos eletrônicos dentro e fora da cabeça para fazer isso acontecer, inclusive um pequeno processador, ímãs dentro do crânio e uma fonte de energia recarregável. Ondas de rádio transmitem som por meio dos ímãs. A primeira pergunta que as pessoas me fazem sobre o implante coclear, quando ouvem sobre os ímãs, é se minha cabeça gruda na geladeira. Não, não gruda. Sei disso porque já tentei. Os ouvintes assumem que os surdos vivem num estado eterno de querer ouvir, porque não conseguem imaginar outro modo. Mas nunca desejei ouvir. Eu só queria fazer parte de uma comunidade como eu. Eu queria que todos fossem surdos. Acho que esse sentimento de pertencimento é o que conecta nossas histórias, e as minhas pareciam incompletas. Quando surgiram os implantes cocleares, na década de 1980, a operação era assustadora como um Frankenstein. Em 2001, o procedimento evoluiu consideravelmente, mas ainda eliminava qualquer audição natural existente. O índice de sucesso na compreensão da fala era baixo, talvez 50%. Se não funcionasse, não era possível reverter. Naquela época, também havia controvérsia sobre os implantes na cultura dos surdos. Basicamente, era considerado o equivalente a mudar a cor da pele.

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Resisti por um tempo, mas minha audição piorava rapidamente, e os aparelhos auditivos não estavam mais ajudando. Em 2003, tomei a difícil decisão de fazer o implante coclear. Eu só precisava interromper esse ciclo de perda desgastante, independentemente de a operação dar certo ou não, e eu achava realmente que não daria. Eu a considerava uma última opção antes de fazer a transição para a surdez total, que uma parte de mim desejava. O silêncio total é muito viciante. Talvez vocês tenham passado algum tempo em um tanque de privação sensorial e entendam o que quero dizer. O silêncio é capaz de expandir a mente. No silêncio, percebo o som. Quando assisto a um videoclipe sem som, consigo ouvir música. Na ausência de som, meu cérebro preenche as lacunas com base no movimento que vejo. Minha mente não está mais competindo com a distração do som. Está liberada para pensar de modo mais criativo. Também há vantagens em ter partes do corpo biônicas. Não dá para negar que é conveniente conseguir ouvir e poder desligar o som sempre que eu quiser.

A tecnologia chegou tão longe, tão rápido. O maior obstáculo que enfrento como pessoa surda não é mais uma barreira física. É a maneira como as pessoas reagem à minha surdez, o modo antiquado como reagem a ela, com pena, condescendência e até raiva, porque isso apenas elimina a conexão humana alcançada pela tecnologia. Certa vez, tive uma colega de quarto de viagem que tinha ataques de raiva porque eu não a ouvia bater na porta quando a chave dela não abria. Se eu não estivesse lá, sem problemas, ela poderia pegar outra chave, mas, quando ela via que eu estava lá, a raiva dela subia à cabeça. Não se tratava mais de uma chave. Tratava-se da surdez não ser um motivo bom o bastante para a inconveniência dela. Ou o comercial sobre o homem surdo cujo bairro o surpreendeu com mensagens em língua de sinais de pessoas na rua. Todos que me enviaram o vídeo disseram que choraram. Perguntei: "E se ele não fosse surdo? E se a língua materna dele fosse o espanhol, e todos aprendessem espanhol? Você teria chorado?" E todos disseram que não. Eles não choraram por causa da barreira da comunicação. Choraram porque o homem era surdo. Mas vejo de modo diferente. E se os Borg aparecessem naquele vídeo e dissessem: "A surdez é irrelevante". Porque é o que eles dizem, não é? Tudo é "irrelevante". E então os Borg assimilassem o surdo, não por piedade, nem por raiva, mas porque ele tinha uma característica biológica que os Borg desejavam, inclusive capacidades linguísticas únicas. Eu preferiria ver esse comercial. Por que pensar em capacidade deixa as pessoas tão pouco à vontade? Vocês devem conhecer uma peça, mais tarde um filme, chamada "Filhos do Silêncio", de Mark Medoff. Essa peça, esse título, vem, na verdade, de um poema de Alfred Tennyson, que, na minha interpretação, diz que os seres humanos vistos como defeituosos foram criados por um Deus menor e vivem uma existência inferior, enquanto os criados pelo Deus real são de uma classe superior, porque Deus não comete erros. Na Segunda Guerra Mundial, estima-se que 275 mil pessoas com deficiência foram assassinadas em campos de extermínio especiais, porque não se encaixavam na visão de Hitler de uma raça superior. Hitler disse que se inspirou nos Estados Unidos, que promulgaram leis de esterilização involuntárias para "os incapazes" no início dos anos 1900. Essa prática continuou em mais de 30 estados até os anos 1970, com a última lei finalmente revogada em 2003. O mundo não está tão distante do poema de Tennyson. Essa tendência de fazer suposições sobre as pessoas com base na capacidade se revela em frases como: "Você é tão especial", "Eu não poderia viver assim" ou "Graças a Deus que não sou eu". Mudar a maneira como as pessoas pensam é como fazê-las largar um hábito. Antes do implante, parei de usar o telefone e mudei para o e-mail, mas as pessoas continuavam me deixando correio de voz. Ficavam chateadas por eu estar inacessível por telefone e por não retornar as mensagens. Continuei explicando a elas minha situação. Levaram meses para se adaptarem. Avançando rapidamente dez anos, vocês sabem quem mais odiava o correio de voz? A geração Y. E sabem o que essa geração fez? Padronizou as mensagens de texto para comunicação. Quando se trata de ignorar o correio de voz, não importa mais se você é surdo ou apenas egoísta. A geração Y mudou o pensamento das pessoas sobre o envio de mensagens. Ela redefiniu o padrão. Posso apenas lhes dizer o quanto adoro enviar mensagens? Ah, e mensagens em grupo. Tenho seis irmãos, todos ouvintes, mas não tenho menos consideração por eles. Todos nós enviamos mensagens. Vocês sabem como é emocionante ter um meio visual de comunicação que todos usam de verdade? Tenho uma missão agora. Como consumidora de tecnologia, quero opções visuais sempre que houver áudio. Não importa se sou surda ou se não quero acordar o bebê. Ambas são igualmente válidas. Designers inteligentes incluem várias maneiras de acesso à tecnologia, mas segregam esse acesso sob o termo "acessibilidade", que só o oculta de usuários tradicionais. Para mudar a maneira como as pessoas pensam, precisamos ser mais do que acessíveis, precisamos estar conectados. A Apple fez isso recentemente. Meu iPhone exibe automaticamente uma transcrição visual de meu correio de voz, ao lado do botão de áudio. Eu não conseguiria desligá-lo, mesmo que quisesse. Sabem o que mais? Netflix, Hulu, Amazon Prime não dizem mais: "Legendas ocultas para deficientes auditivos". Eles dizem "legendas", "ativado" ou "desativado", com uma lista de idiomas abaixo, inclusive o inglês. A tecnologia chegou tão longe. Nossa mentalidade só precisa recuperar o atraso.





 
 
 

Atualizado: 30 de jan. de 2022


Meu nome é Josiane tenho 39 anos, sou formada em Psicologia pela Universidade Nove de Julho e sou uma surda que ouve (#surdosqueouvem). Minha jornada frente a surdez começou em 2003 quando eu estava com 21 anos de idade. Convivo com a surdez há 17 anos.


Minha mãe começou a perceber que eu não estava mais conseguindo ouvir ela chamar ou ainda entendia tudo que ela falava errado. Ao atender o telefone tinha dificuldades de entender o que diziam e era um sufoco e mesmo assim eu não consegui perceber que estava com perda de audição. Inicialmente minha família entendeu que eu estava simulando a perda de audição e que eu somente escutava aquilo que me era conveniente.


Então sozinha lá fui eu para o hospital público CEMA aqui em São Paulo para ver o que de fato o que ocorria. Sinceramente eu não sabia exatamente o que estava acontecendo eu apenas fui. Passei pelo Otorrinolaringologista que logo solicitou para o mesmo dia a audiometria. Eu passei o dia todo no hospital.


Fiz o exame e retornei para o médico que me informou sem muitos rodeios que eu estava perdendo muito rapidamente a audição (50 db em ambos os ouvidos) em nível MODERADO e que precisaria fazer exames complementares para encontrar a causa. Fiz todos os exames que existem, Bera, Hemograma completo, curva insulínica entre outros que não me recordo agora, foram 3 anos entre vindas e idas.

Quando finalmente recebi o diagnóstico de Perda Auditiva Bilateral Neurossensorial Simétrica Idiopática. Simétrica porque a perda é igual em ambos os ouvidos e idiopática por ser de causa desconhecida. Na época eu não sabia exatamente o que tudo isso significava. Lembro de chegar em casa e contar aos meus pais que logo disseram que os médicos (uma junta médica de especialistas) estavam equivocados e que eu estava fingindo, e possivelmente forjei os exames, como se isso fosse de fato possível. Agora em 2021 descobri finalmente a causa da minha surdez, depois de realizar o exame de Eletrococleografia foi identificado que tenho a doença de Meniérie, o que torna a minha surdez progressiva.

Foi aí que me dei conta que estava literalmente sozinha e que o caminho seria árduo e difícil. Os preconceitos foram se acumulando dentro e fora de casa e principalmente na área médica e corporativa. Era comum eu ter que “provar” que eu tinha surdez diariamente, frases como “Nossa, mas você fala tão bem, não parece que tem surdez”; “Mas espera surdos são mudos, como você pode ser surda? ”; “Ah que pena, você é tão bonita para ser surda! ”; “Como vou saber que você não está fingindo? ”


Começaram os trâmites para aquisição de aparelhos auditivos já que minha surdez é bilateral, nunca vou me esquecer da fonoaudióloga que me acompanhou e me disse que “eu precisava esconder minha surdez” afinal eu sou muito bonita para ser classificada como uma pessoa com deficiência e que diante disso quanto mais eu escondesse melhor”.


Foram 3 anos usando aparelhos intracanais e que me obrigavam a tirar eles afim de provar todos os dias que eu tinha surdez. Mas minha audição piorou e eles não mais conseguiam me ajudar e novamente lá estava eu de volta ao consultório do Otorrinolaringologista onde fui informada que precisaria de aparelhos novos e mais potentes. Eu não tinha condições de comprar na época e o que eu fiz foi fazer o que me pediam, ignorar a surdez por completo por anos.


Piadinhas, brincadeiras, deboches eram diários tanto dentro de casa como fora. Mas eu não desisti, fui atrás dos meus direitos e adquiri a carteirinha especial para a pessoa com deficiência que me foi negada suas vezes mesmo estando com laudo e audiometria. Mas finalmente consegui e utilizo até hoje, no próximo ano terei que renovar, ela é válida por 4 anos.


Por incrível que pareça as únicas pessoas que realmente me acolheram foram os surdos que utilizam a língua de Sinais, na época não se existia os movimentos em prol da diversidade da Surdez como hoje. Aprendi a língua e convivi muito com ela, embora não dependa dela para me comunicar.


Durante os anos em que fiquei privada do som eu tive raiva de fonoaudiólogo, de aparelhos auditivos, de televisão e telefones. Assistir filmes era um martírio, atender telefone era traumático, ir a fono nem pensar eles sempre me colocavam pra baixo.


Em 2018 resolvi tentar novamente pelo SUS e consegui e foi lá que vi que há fonoaudiólogos humanos e sensíveis a dor de seus pacientes. Ela me explicou tudo, tirou minhas dúvidas e ainda se sensibilizou quando minha mãe disse que eu não era uma pessoa normal para ter que usar aparelhos auditivos. De maneira assertiva e firme ela disse que minha mãe deveria me apoiar e não ser a primeira a atirar pedras. Não é minha culpa ter perdido a audição. Ela deveria aceitar que sua filha é surda. Depois desse dia nunca mais mãe me distratou ou fez piadinhas comigo, hoje ela é a primeira a dizer as pessoas que tenho surdez e que precisam falar de frente comigo e devagar e repetir se for necessário. Sempre que ela vem falar comigo ela pergunta se estou com os aparelhos para que eu não entenda tudo errado. Claro que nem tudo é perfeito e ela ainda acha que basta estar com os aparelhos que a minha audição volta ao normal e então incansavelmente explico que os aparelhos auxiliam, mas não me dão ouvidos novos.


No universo corporativo eram piadas, caras e bocas sobre minha surdez afinal estou com os aparelhos auditivos então voltei a ouvir normalmente. Sim as pessoas gritavam comigo no trabalho para me chamarem e não adiantava, porque precisavam tocar nos meus ombros para que eu me virasse para elas. Mas foi em 2019 que achei meu lugar no mundo quando conheci o projeto #surdosqueouvem da maravilhosa Paula Pfeiffer. Finalmente eu não mais estava sozinha eu tinha uma legião de pessoas iguais a mim.



Além disso o Neurocirurgião Oliver Sacks (1933-2015) me trouxe o conceito de SURDOS ORALIZADOS ao classificar os surdos que adquirem a surdez após a aquisição da língua materna (surdez pós linguística) ao publicar o livro “Vendo vozes: Uma viagem ao mundo dos Surdos”


Percebi que meu lugar não era na Língua de Sinais porque eu não dependo dela para viver, ainda que eu goste da língua e a use em meus atendimentos a surdos porque a surdez é diversa. Comecei a pesquisar sobre surdos oralizados e me surpreendi ao verificar que quase não se existe literatura que fale a respeito e muito menos profissionais da psicologia voltados para este público. Foi a partir desta visão que eu criei um Instagram e passei a fomentar, discutir e informar sobre a surdez em surdos oralizados.


Não posso deixar de mencionar outra grande representante Lak Lobato comunicadora, escritora e palestrante que luta pelos surdos oralizados. O livro abaixo é o que mais me chamou atenção em seus escritos.


Mais recentemente consegui realizar a compra de aparelhos auditivos mais modernos devido a minha audição ter se agravado e atualmente me encontro no nível SEVERO, anteriormente eu usava a marca Resound e agora a marca Phonak Marvel que me trouxe para o mundo dos sons novamente e da conectividade. Hoje para atender uma ligação, ouvir áudios eu faço tudo através destes aparelhos. Voltei a assistir televisão e conversar mais com as pessoas. Realizo meus atendimentos todos conectados com eles.


Limiares da audição:

Leve

Moderado

Severo Onde me encontro atualmente

Profundo


Minha surdez é PROGRESSIVA a medida em que ela vem se agravando ao longo do tempo até porque eu fui informada desde início. E é incrível como minha audição piorou em tão pouco tempo (17 anos). Convivo com o zumbido há 10 anos 8 meses e nunca me senti incomodada por ele, mas sei que está por aqui o tempo todo.


Através do Instagram tenho conhecido tantas pessoas que me ensinam diariamente que temos voz, que não somos invisíveis e que informação gera conhecimento e autonomia. Mas recentemente passei por um episódio de preconceito (Capacitismo) por parte do mercado de trabalho após ter declarado que minha audição tinha piorado fui demitida em virtude da minha deficiência. É revoltante que eu seja julgada não pela minha capacidade, mas pela deficiência, pela surdez. Minha experiência e formação em nada importam. Me senti inútil e com sentimento de fracasso.


Capacitismo é um termo utilizado para descrever a discriminação, opressão e abuso advindos da noção de que pessoas com deficiência são inferiores ás pessoas sem deficiência. Ou seja, é um tipo de preconceito com as pessoas com deficiência, pela sociedade e seus achismos de que esta não pode ter sua vida normal como qualquer outro.


Sigo no meu percurso feliz por todo caminho trilhado até aqui, me sinto orgulhosa de todo meu empenho para lidar com os desafios frente a surdez. E mais forte a cada dia para levantar minha voz (lembrando que quem é surdo não é mudo) para lutar por mais respeito, inclusão, acessibilidade e diversidade.





NÓS PODEMOS!

A SURDEZ É INVISIVEL NÓS NÃO!!!

Psicóloga surda Josiane - Instagram: @josiane.psi CRP 06/161457 – SP

Atendimento Psicológico a Surdos Oralizados e usuários da Língua de Sinais




 
 
 

Já falei aqui da minha alegria sempre que encontro novos autores que escrevem sobre o seu processo com a surdez, isso traz representatividade e também referência para todos os que em algum momento de suas vidas se deparam com o diagnóstico da surdez.


Nuccia De Cicco é surda oralizada e escritora além de comandar uma editora e decidiu escrever sobre o seu processo com a surdez Ela é escritora de outros livros e contos sobre terror o que faz dela uma autora ousada e diversa.


Eu ainda não comecei a leitura devido a minha lista estar outras autoras que também retratam a surdez, mas pude dar uma folheada e já percebi que é muito mais que uma biografia, porque traz informação e conhecimento sobre diversos assuntos relacionados a surdez e isso faz deste livro um item necessário para quem ainda está tentando entender seu próprio processo dentro da surdez.


Recomendo fortemente a leitura tanto que comprei a versão e-book e impressa para ter em minha coleção. A leitura salva, ainda mais se for sobre o que vivemos em nossa realidade não é mesmo?


Psicóloga Josiane

 
 
 
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